25.7.12

Avesso



Abriu os olhos, coçou a testa suada e olhou para o relógio. Ainda podia dormir mais 17 minutos até o despertador anunciar o fim da cama e o início do dia. O peso em sua mente o deixaria facilmente ali por um dia inteiro. "Agosto", ele pensou, já estava em agosto e fazia quase um ano que não dormia direito. Pensou na constância dos seus sentimentos e na sua insistência. O coração estava tumultuado, mesmo com o passar dos meses.

Os poucos segundos de beijo que tinha, aliado à ausência de todo o resto não eram suficientes para que ele se sentisse bem novamente, para que esquecesse, para que quisesse esquecer. Rolou na cama e tentou dormir. Sentiu frio e calor, raiva e paz. E acima de tudo, o peso.  

O primeiro pensamento que lhe vem à mente é sempre ela. E antes de dormir contabilizava o nada que achava que tinha, esperava achar significado no antes. Avesso. Ele estava ao avesso. 

Tentar lembrar quem era em setembro passado era o que mais o afligia; e concluiu que não estava miserável como agora. Antes do sorriso e da voz que o tomaram de súbito e o arrebataram direto para o inferno, de quem está sozinho no palco em um triste monólogo apaixonado.

A esperança não está nas músicas ou nas poesias que parecem girar em torno de seu corpo como num filme. A esperança certamente não está nos filmes.

Ele pensou que assim como o outro amor se esvaiu com o tempo e com o cansaço, esse independente da longevidade, que era curta pra ele, passaria. E o céu seria mais azul e a poeta de sorriso encantador ganharia seu coração. E seus cabelos ao vento seriam mais belos e a voz mais suave.

Ele iniciaria tudo de vez, assumiria todo o risco de uma nova paixão. Todo o pavor de uma nova rejeição. Abraçaria de coração limpo o futuro não planejado. E para quem não conseguia suportar mais do que uma semana de futuro e vivia de sexta em sexta, habitando os bares em más companhias para achar dor proporcional, o otimismo seria uma dádiva.
Ele deve enfim se permitir magoar novamente.

E levantou para mais uma quarta-feira. 

Raquel Pimentel