Abriu os olhos, coçou a testa suada e olhou para o relógio. Ainda podia dormir mais 17 minutos até o despertador anunciar o fim da cama e o início do dia. O peso em sua mente o deixaria facilmente ali por um dia inteiro. "Agosto", ele pensou, já estava em agosto e fazia quase um ano que não dormia direito. Pensou na constância dos seus sentimentos e na sua insistência. O coração estava tumultuado, mesmo com o passar dos meses.
Os poucos segundos de
beijo que tinha, aliado à ausência de todo o resto não eram suficientes para que
ele se sentisse bem novamente, para que esquecesse, para que quisesse esquecer.
Rolou na cama e tentou dormir. Sentiu frio e calor, raiva e paz. E acima de
tudo, o peso.
O primeiro pensamento que
lhe vem à mente é sempre ela. E antes de dormir contabilizava o nada que achava
que tinha, esperava achar significado no antes. Avesso. Ele estava ao avesso.
Tentar lembrar quem era
em setembro passado era o que mais o afligia; e concluiu que não estava
miserável como agora. Antes do sorriso e da voz que o tomaram de súbito e o
arrebataram direto para o inferno, de quem está sozinho no palco em um triste
monólogo apaixonado.
A esperança não está nas
músicas ou nas poesias que parecem girar em torno de seu corpo como num filme.
A esperança certamente não está nos filmes.
Ele pensou que assim como
o outro amor se esvaiu com o tempo e com o cansaço, esse independente da
longevidade, que era curta pra ele, passaria. E o céu seria mais azul e a poeta
de sorriso encantador ganharia seu coração. E seus cabelos ao vento seriam mais
belos e a voz mais suave.
Ele iniciaria tudo de
vez, assumiria todo o risco de uma nova paixão. Todo o pavor de uma nova
rejeição. Abraçaria de coração limpo o futuro não planejado. E para quem não conseguia
suportar mais do que uma semana de futuro e vivia de sexta em sexta, habitando os bares em más companhias para achar dor proporcional, o otimismo seria uma
dádiva.
Ele deve enfim se
permitir magoar novamente.
E levantou para mais uma
quarta-feira.
Raquel Pimentel